Painter of the Universe – A história

capa do album painter of the universe

Acompanhe a jornada de Elliot através de um mundo decadente e uma sociedade à beira do abismo

1000 Lights in the Sky

Ainda que Elliot não soubesse o motivo, ele se levantou da cama naquela fria madrugada. Um impulso o levara para fora de sua casa e o deixara de frente com a maior incógnita da humanidade. Era difícil descrever a sensação, pois, ao contrário de um sonho, tudo se encaixava e ele sabia que, ainda que assustadora, aquela era a realidade. Subitamente, o frio havia se dissipado e um calor inexplicável irradiava pelo solo, vindo de cima. Os olhos viam o que a mente falhava em explicar. As trevas da madrugada eram dissipadas por incontáveis luzes no céu. Elliot esfregou os olhos, tentando se iludir que acreditava ser um sonho. Ao seu redor, várias pessoas haviam sentido a mesma urgência e abandonado suas casas, como se atendessem a um chamado. Enquanto o rapaz não sabia como reagir ou mesmo o que sentir, muitas das pessoas ao seu redor choravam copiosamente. Pensamentos bagunçados tomavam sua mente e ele escutava frases desconexas.

— São os anjos de Deus! Vieram nos agraciar! – gritava uma senhora.

— Anjos? Não são anjos! O Apocalipse! Iremos todos morrer! – bradou um homem com sua esposa desmaiada em seus braços.

— Não há motivo para alarde, eu tenho certeza de que existe uma explicação científica para isso! – um rapaz tentava acalmar os presentes.

No dia seguinte, cientistas do mundo todo tentavam compreender as 1000 Luzes No Céu, enquanto milhões de religiosos ao redor do globo se reuniam em seus templos em busca de perdão por seus pecados ou orando em agradecimento.

Dream Crushers

Algumas semanas passaram e ninguém conseguia explicar a origem das luzes, o que fazia com que cada dia surgissem mais e mais teorias. As pessoas agiam de maneira impulsiva e impune, buscando de forma egoísta, saciar a todos os seus desejos mais mundanos. Em todas as mídias, as notícias que giravam o globo, mostravam uma sociedade fria na qual o mais forte sobrepujava o mais fraco. Elliot sentia que aquela não era a maneira de se viver. Ele, como um eterno sonhador, ainda acreditava que deveríamos estender a mão para os menos favorecidos e ajudá-los a encontrar esperança.

O sonhador então se depara com uma realidade terrível e dolorosa. A realidade para qual, muitas vezes, ele havia fechado os olhos. O comportamento da sociedade não havia mudado em nada desde o surgimento das estranhas luzes. As pessoas apenas haviam perdido o receio da exposição. Enquanto muitos acreditavam que a humanidade estava vivendo seus últimos dias e escolhiam viver na plenitude de seus desejos mais ocultos, outros buscavam redenção, com medo de um possível juízo final.

Elliot saiu para caminhar. As noites eram claras como o dia, uma vez que as luzes acendiam os céus. Tudo ao seu redor era um retrato dos dilemas que sempre estiveram ali. Vale a pena viver daquela forma? Se as luzes eram um sinal divino, a que se referiam? Qual seria a mensagem? A verdade era que Elliot sentia-se mais vazio do que nunca e começava a duvidar da capacidade humana em fazer o bem de maneira altruísta. Ele via que grande parte da população era formada pelo que ele havia definido como Esmagadores De Sonhos.

Ele havia chegado a esse nome após perceber que, para alcançar seus objetivos na vida, algumas pessoas passavam por cima de seus semelhantes, aparentemente, sem qualquer tipo de remorso. Elliot, sentindo um indescritível pesar, cantava suas canções favoritas, caminhando pelas ruas, cheias de pessoas e vazias de sentimento. Ele sabia que aquela poderia ser a última vez que entoava suas melodias. A contagem regressiva parecia estar ativa.

Where I Am

Os dias passavam e as luzes continuavam pairando no ar, inalcançáveis. Inexplicáveis. Os efeitos do fenômeno atingem as pessoas de maneiras muito diferentes. Alguns seguem os dogmas que lhes foram pregados ao longo do tempo, enquanto outros, deixam que os prazeres mundanos os dominem. A realidade é que nenhum ser vivo é capaz de prever o futuro da humanidade e, ainda assim, apostas são feitas. Os sons das sirenes permeiam o ambiente. Gritos e gargalhadas preenchem as lacunas de uma sociedade decadente.
Algumas pessoas temem que esse seja um teste de Deus e se mantêm firmes, ignorando aqueles que tentam desviá-los de seus caminhos e, principalmente, ignorando os próprios desejos. Em meio à loucura da população, que parecia viver seus últimos dias de maneira displicente, o caos dominou e Elliot se viu perdido entre o moralmente correto e seus desejos mais ocultos. Uma batalha contra si e a constante luta em sua mente, levaram o jovem ao extremo de sua tortura mental. Em seu coração, Elliot ainda teme um julgamento divino, mas em seu lado racional, ele acredita que todos foram abandonados por Deus.

Uma visão peculiar chama a atenção de Elliot. Uma garotinha está caminhando pelas ruas durante uma noite fria. Ela parece triste, mas ainda assim, diferente das outras pessoas. Enquanto a maioria está lutando contra o certo e o errado, ela parece viver de maneira firme e confiante. O rapaz se aproxima e inicia uma conversa.

— Você está bem? Está perdida? – o rapaz retira seu casaco e envolve a garotinha com ele.

— Eu estou bem. Eu moro aqui! – ela sorri ao receber o presente e expressa um sorriso sincero de alegria.

— Aqui? Onde?

— Aqui, ali. Em todos os lugares.

— Mas você se perdeu de sua família? Onde estão todos?

— Eu não tenho uma família.

Elliot sente que a garota precisa de ajuda, mas se sente impotente diante da atual situação.

— Você está sozinha nesse mundo caótico? – uma lágrima esboça sair de um de seus olhos.

— Todos estamos.

As palavras da garotinha atingiram o coração de Elliot como uma faca. Ela estava certa, estamos todos sozinhos. Uma onda de desesperança atingiu o jovem e sua visão começou a turvar. Os sons da cidade pareciam distantes e bagunçados. Quando ele percebeu, estava perdido em meio às loucuras e decisões ruins, assim como a grande maioria das pessoas. Eis que ele foi surpreendido pela garotinha, que o acordou de um transe dizendo:

— Não precisa ser assim! Você não é como eles!

Tomado pelas dúvidas, Elliot perguntou à garotinha:

— E o que devo fazer? O que você faria se estivesse em meu lugar? O que você faria Onde Estou Agora?

Stains in the Shadows

As semanas se passaram e Elliot havia percebido que não valia a pena viver como a parte decadente da população. Porém, ele não fazia ideia de como seguir com sua vida e passou a vagar sem rumo. Certo dia, ele avistou um velho senhor que se destacou em meio às outras pessoas. O velho tinha um semblante de desprezo e olhava com raiva para as pessoas ao seu redor. Ele percebeu que Elliot o encarava e se aproximou do rapaz.
— Pode morrer amanhã, sabia disso?

— Pouco me importa – Elliot respondeu de maneira áspera, pois havia achado bastante invasiva a aproximação do velho.

— Talvez você morra hoje!

Elliot, inicialmente, pensou que aquilo pudesse ter sido uma ameaça, mas o velho continuou:

— E se isso acontecer, será realmente o seu fim!

O velho parecia apenas mais um maluco, mas ao mesmo tempo, parecia ser alguém com uma enorme e pesada história de vida. Elliot acabou tendo interesse no que ele tinha para dizer. Há uma linha muito tênue que separa a sabedoria da loucura.

— O senhor parece ter uma história a contar.

— Todos temos, meu jovem. Todos temos.

— Se isso é verdade, talvez a minha história não valha a pena ser contada.

— Não diga besteiras! Não é uma questão de valer a pena ou não, mas sim se teremos tempo para criar novas histórias que possam ser contadas.

— O senhor também acredita que o mundo está acabando?

— Filho, a partir do dia em que você nasceu, seu mundo já estava acabando. Um dia por vez.

— O senhor não acredita que podemos escrever novas histórias após a morte? Talvez possamos recomeçar do zero em uma vida totalmente diferente.

— Besteira! – o velho cuspiu no chão e secou o excesso de sua boca com o braço.

Elliot percebeu que aquele senhor era um velho amargurado, mas que sua vida havia sido difícil o suficiente para deixá-lo daquela maneira.

— Filho, olha lá! – o velho apontou para o céu – Acredita realmente que existe alguém olhando por você lá em cima?

Elliot sentiu a pouca esperança que lhe restava se esvair por entre seus dedos. O velho estava certo. Não havia nenhum sinal de que teríamos uma segunda chance. Não havia sinal de que existia um julgamento. As maldades que as pessoas faziam na Terra, jamais seriam pesadas contra elas no juízo final. As pessoas eram egoístas e jamais seriam punidas por isso, assim como as benfeitorias de alguns jamais seriam recompensadas.

— Desculpe-me por lhe abrir os olhos dessa forma, garoto, mas nós somos apenas Manchas Na Escuridão! Grãos de areia no universo! Se realmente existir algo além do que nosso pobre conhecimento é capaz de alcançar, está tão distante de nós que nos tornamos irrelevantes perante o universo.

Expendable

O velho abriu os olhos de Elliot de uma vez por todas e ele não era mais capaz de esconder seu sentimento de revolta. Caminhando por entre as pessoas que compunham uma sociedade fria e egoísta, Elliot, O Sonhador, percebeu que seus sentimentos se misturavam e se transformavam.
Ele sentia raiva, mas ao mesmo tempo, sentia pena da humanidade. Aos seus olhos, todos eram crianças lutando eternamente pelo carinho do “Pai”. Buscavam obter a aprovação de alguém que nem mesmo sabiam se existia. Seria isso fé ou apenas medo de um Juiz frio e impiedoso?

Será que suas escolhas determinam seu futuro ou você está fadado a trilhar de maneira cega por um caminho predeterminado por algum ser sádico com poderes sobre você? Muitas vezes acreditamos que somos os astros no filme de nossa vida, mas sem nos lembrarmos de que todo filme tem por trás um diretor. Somos atores improvisando em cima de um palco ou apenas seguimos um roteiro oculto diante de uma plateia escondida?

— Estamos sozinhos nesse infindável universo?

— Nunca saberemos – respondeu o Velho Amargurado.

— Existe um propósito para estarmos aqui?

— Nunca saberemos.

— No fim, com todas essas dúvidas, vale a pena estar aqui?

— Valeu a pena para você até hoje?

— Não sou capaz de analisar isso. Não nesse momento – respondeu Elliot, confuso.

— Você já percebeu como algumas pessoas acreditam ser melhores do que as outras?

— Acredito que não exista alguém que não perceba isso.

— Pois é, existe. A própria pessoa.

Elliot manteve um silêncio reflexivo, atento ao que o velho tinha a dizer.

— Muitas pessoas têm a necessidade de se reafirmar constantemente. Muitos cresceram sem a atenção ou aprovação de seus pais ou receberam fardos muito pesados e não souberam como carregá-los de maneira honrosa. Eles precisam acreditar que são melhores do que os outros para serem aprovados.

— Mas para quem eles precisam provar? Muitas vezes eles já atingiram o sucesso que tanto almejavam e, ainda assim, continuam a passar por cima dos mais fracos para lutar por seus objetivos! – opinou Elliot.

— Eles buscam a única aprovação que jamais terão: a própria.

Elliot tentava assimilar aquelas palavras e encontrar razão.

— A realidade é que, assim como todos nós, eles são Descartáveis.

Merchants of Madness

O Sonhador resolve procurar por outras opiniões e seu caminho o leva até uma grande igreja. Por toda sua vida, ele havia se mantido alheio à religião, pois temia que jamais poderia sentir-se como aqueles que possuem fé. Ele sabia que seu cérebro não seria enganado por estímulos externos, mas tinha esperança de que pudessem tocar seu coração.
— Irmãos! O fim está realmente chegando! – bradou o homem no centro de um palco cheio de aparelhagem e uma estrutura digna de um rockstar.

As pessoas no templo olhavam para cima e choravam, gritavam e imploravam por perdão pelos seus pecados. Uma bagunça sonora que deixava os pensamentos de Elliot ainda mais confusos.

— Este pode ser o último dia para vocês se arrependerem!

Mais gritos de comoção eram ouvidos.

— Esta será a última chance de fazer a coisa certa!

Naquele momento, o homem, trajando um caríssimo terno italiano, cabelos e barba impecavelmente cuidados, armou um semblante mais sério e encarou os fiéis.

— Livrem-se de todo o mal que conquistaram através das investidas sujas do Satanás! O reino material não é coisa de Deus! Livrem-se, doem para os mais necessitados! Ou melhor, entreguem-nos tudo o que vocês possuem e nós faremos o difícil papel de tirar de suas mãos os bens do diabo!

O templo quase estremeceu com os gritos de seus frequentadores. O homem em cima do palco olhava satisfeito, com um sutil sorriso no canto da boca. Sua missão estava cumprida. Indignado com aquilo, Elliot se aproximou e confrontou o homem.

— Você não é um missionário de Deus! Você é um demônio disfarçado! Você engana as pessoas e…

Elliot foi interrompido por dois dos vários seguranças que haviam no local. Eles o agarraram, torcendo seus braços. O Orador, sem perder o sorriso demoníaco em sua face, olhou para Elliot e, em seguida, para as pessoas que ali estavam, indignadas com a intromissão de Elliot.

— Vocês estão vendo, irmãos? É assim que o demônio age quando nós estamos prontos para seguir as ordens de Deus! Ele envia seus servos para nos confundir!

— Vocês mentem, vocês…

Mais seguranças se aproximaram, obstruindo a visão que as pessoas poderiam ter de Elliot e um deles deu um soco em seu estômago, deixando-o sem ar.

— Esse jovem está nitidamente possuído! É isso que vocês querem para seus filhos? É isso que querem para vocês?

A multidão no grande templo ovacionou o Orador, que sorriu orgulhoso. Com um ódio latente tomando conta, Elliot foi capaz de gritar a plenos pulmões:

— Vocês oferecem a paz, mas nos entregam o inferno! Vocês são apenas Mercadores De Loucura e eu estarei lá quando vocês caírem!!

The Core of Creation

Enquanto a comunidade científica mundial se distraía com as estranhas luzes que haviam aparecido no céu há alguns meses, um buraco negro supermassivo começou a crescer em um ritmo que desafiava todas as leis da física. Nosso conhecimento tornou-se praticamente nulo perante sua magnitude. Toda nossa história sendo consumida e retornando ao Núcleo Da Criação. Agora é hora de nos lembrarmos do futuro que perdemos.

Painter of the Universe

Um infinito aquarelado. Galáxias se formando e se acabando. O silêncio da criação que alimentava os estrondos da destruição. Os ciclos possuíam tempo determinado, mas alguns possuíam um tempo muito mais curto que outros. A morada do Pintor Do Universo era tão impressionante quanto ele próprio. O infinito do espaço com suas cores e texturas. Seu residente era uma criatura única na Criação, para não dizer, solitária. Nada naquele universo paralelo o afetava mais do que ele desejava. Suas pinturas criavam universos inteiros e eles floresciam com vidas. O enorme ser possuía uma pele que mudava de cor rapidamente. Seus olhos eram tão imensos que cabiam galáxias dentro dele.
Do topo de seu solene trono translúcido, ele observava a humanidade. Sua criação havia sido feita com carinho, mas eles se perderam no caminho. Criaram deuses para adorar, pois não se sentiam completos. Inventaram e reinventaram o renascimento, pois queriam uma certeza de que jamais teriam um fim verdadeiro. Infelizmente, inventaram também o ódio, a inveja, a mentira e várias outras peculiaridades do ser humano. Sua criação não mais parecia ter salvação. Os seres humanos eram destrutivos demais para serem deixados para agir por conta própria.

O Pintor tinha toda a infinidade dos multiversos ao seu dispor, tudo se transformava em sua tela e ele poderia pintar infindáveis vidas e histórias com uma única pincelada, mas seu poder destrutivo era tão grande quanto. Na relatividade do tempo, os seres humanos sentiam que ainda havia esperança, mas a decisão já estava tomada. Não há mais tempo. Não há nada mais a fazer.

All in Vain

O fim do egoísmo. O fim da mentira, da dor, ganância, arrogância. O Fim da humanidade. A poeira estelar multicolorida se espalhou pelo quase infinito universo. Poeiras de sonhos, conquistas, lágrimas e sorrisos. As cores que formavam aquarelas no céu, agora eram apenas fragmentos de memórias. Poderia ter sido diferente? Poderíamos ter evitado tudo isso? Mas qual seria o caminho?
Como seres humanos, somos cegos guiados por outros cegos na escuridão. Criamos nossas próprias regras e leis para evitar o frio da indiferença diante do restante da Criação. Não sabemos quais caminhos devemos trilhar, portanto, criamos nossa própria estrada. Quando uma luz se apaga, nós procuramos por outras. Nosso ciclo é fugir de um erro e cometer outro.

Elliot abre os olhos para uma nova realidade. A total ausência de cores? Seria isso um branco infinito? Ou não existe um nome para essa cor diante de seus olhos? Sua consciência tornou-se plena e ele entendeu que seu mundo deixou de existir. Não havia mais homens, mulheres ou crianças. Os bichinhos de estimação haviam se tornado pó, junto com todas as outras coisas. Plantamos o caos, ele cresceu e, antes que pudéssemos fazer a colheita, ele nos consumiu. Todas as pessoas foram finalmente colocadas em seus devidos lugares, eram todos iguais, finalmente. As cores de suas peles, as contas bancárias…nada mais importava, pois só havia restado…o pó.

Tudo o que a humanidade aprendeu e tudo o que ensinou. E agora todos os sorrisos, risadas e gargalhadas se foram. Foi tudo um desperdício? Foi Tudo Em Vão.

Elliot In the Dust - The Cloud Strider

Finalmente, a concepção da verdade divina tomou sua forma. A surpreendente verdade…
Eu sou você e nós somos tudo. Nhanderuvuçu, o Pintor Do Universo, aquele que Caminha Sobre As Nuvens desperta de seu transe. Ele havia realmente vivido aquela vida? Uma dúvida, porém, rondou os pensamentos dele por muito tempo após o fim da humanidade: ele era o Sonhador, Elliot, Aquele Que Caminha Sobre As Nuvens, que havia caminhado pela Terra e estava finalmente de volta ao seu lar entre uma miríade de universos, ou ele era o jovem Elliot experienciando a vida após a morte? Em algum momento, ele havia se deixado seduzir pelo carisma do ser humano e acabou se perdendo em suas próprias criações.

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